A gestão Michel Temer já deu sinais de saber muito bem que não há almoço grátis. Os empresários que financiaram o golpe agora cobram celeridade em uma reforma trabalhista baseada no avanço do negociado sobre o legislado e na aprovação da terceirização sem limites.
Durante reunião do Coletivo Nacional de Mulheres da CUT, na manhã desta quarta-feira (15), em São Paulo, a socióloga e representante do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), Adriana Marcolino, apontou que o progresso desses dois pontos é o suficiente para desregulamentar o mercado de trabalho.
“Ao permitir que a convenção coletiva prevaleça sobre normas legais, o negociado sobre o legislado, você abre espaço para que, em épocas de crise como a que vivemos agora, patrões falem ‘ou seu empregou ou o pagamento de hora extra’. E muitos trabalhadores, com a corda no pescoço, vão topar medidas que retiram direitos para manter o trabalho. Além disso, temos um problema de a sindicalização ser muito baixa no Brasil e a legislação engessar a própria atuação dos sindicatos”, explica.
Já em relação à terceirização, com base nos programas do PMDB “Ponte para Futuro”, “Agenda Brasil” e “Travessia Social”, ela observa que a regulamentação desse modelo de contratação se daria pelo viés da precarização.
“Essas plataformas falam de regulamentar terceirização paga garantir ambiente seguro às empresas, para que não sejam processadas, e não para garantir condições dignas aos terceirizados. Com negociado sobre legislado e a terceirização neste viés há a reforma completa trabalhista que eles querem, desconstruindo direitos dos trabalhadores”, define.
Para Adriana Marcolino, a crise é uma oportunidade única para os setores que financiaram o golpe promoverem arranjos profundos na Constituição cidadã de 1988.
“Há percentuais do PIB (Produto Interno Bruto) que os governos devem investir em saúde e educação e o governo interino quer desmontar essa obrigatoriedade, estabelecer um teto. Em 1988, o ganho foi justamente garantir educação e saúde universais e verbas para financiar políticas.”
Ela diz que o mesmo vale para o mercado de trabalho, que cresceu em qualidade e formalização e agora é alvo central do ajuste.
“A atual característica do desemprego não é a rotatividade, mas a destruição de postos de trabalho. Tivemos a melhoria na qualidade do emprego, aumentamos postos formais, tivemos ganhos salariais sensíveis e uma crise dessa é a oportunidade para reestruturação pelos empregadores e para um ajuste muito forte na economia via mundo do trabalho."
Exemplos do retrocesso
Os apertos, ressaltou Adriana, utilizam o argumento do equilíbrio fiscal e da desburocratização do país para permitir ações como a diminuição da obrigatoriedade de licenciamento ambiental para empresas impedirem a taxação de renda.
Enquanto isso, do outro lado, o país mantém uma política que beneficia rentistas e paga R$500 bilhões de juros ao rentistas, cinco vezes mais do que o orçamento do SUS (Sistema Único de Saúde).
“Vão estabelecer teto de custeio, acabar com políticas sociais e dois, três anos podem diminuir impostos porque não têm mais políticas para financiar. E essas medidas estão tramitando com muita velocidade, porque esse Congresso, o mais conservador desde 1964, está alinhado com isso”, avalia.
Como mudar
Adriana Marcolino sugere mudar a aferição das metas de inflação para cada três anos, como forma de fazer com que a economia possa refletir medidas voltadas à geração de emprego e evitar choques de curto prazo que sacrificam o desenvolvimento.
Além disso, ela defende ampliar o investimento em infraestrutura, especialmente para destravar os setores de petróleo e gás, a construção civil, o setor social e a redução da taxa de juros.
“Cada vez que aumenta a taxa Selic, os títulos que o governo vende para se financiar ficam mais atrativos, valem mais para quem vive de especulação, e o setor produtivo sofre com dificuldade para investir na produção”, conclui.